A Nova Era – semana #130: captain, it's Brasil
Olá, tudo bom?
A pandemia segue com o mesmo roteiro das últimas semanas, mas agora temos uma nova variante do coronavírus circulando no país. Enquanto isso, artistas, gamers e outras pessoas que precisam cuidar da sua imagem para fazer dinheiro perceberam que criticar o governo dá muito dinheiro.
Do lado do governo, há um novo escândalo para Bolsonaro chamar de seu. Não dá para dizermos o impacto que isso terá na sua popularidade, mas é um mal presságio para quem já aparece perdendo para o Lula no primeiro turno em pesquisa eleitoral, algo que o petista não conseguiu fazer nem quando o apagão se deu em um governo tucano. Ah, sim, o Guedes fez algo, mas isso será assunto para a mensagem da próxima semana.
Veja isso e muito mais a seguir e, caso você também seja vítima de um serviço de e-mail com mau humor, basta clicar aqui e ler o texto inteiro.
The following takes place between jun-22 and jun-28
Racionamento de Schrödinger
O governo mandou avisar que, ao contrário do que afirma Arthur Lira, não teremos apagão em 2021 e em 2022. Sim, a conta de luz está aumentando em função da seca dos reservatórios, não há previsão de aumento de chuvas no futuro e a economia está, aos poucos, retomando os níveis de atividade pré-pandemia. Mas não há motivos para supor que a chegada das estações quentes, ao lado desses e outros fatores, impactará na nossa habilidade de acender uma lâmpada sem pagar o preço de um filet mignon (quando a energia chegar na nossa casa, claro).
É só ser educado, ignorar o Ibama e torcer a favor do país que dará tudo certo. Mas torça analogicamente, pois a bandeira tarifária ficou 52% mais cara somente nesta semana.
Números horríveis
Os últimos dias não foram de felicidade para quem se importa com a catástrofe climática que se avizinha no horizonte. Mesmo com a saída de Ricardo Salles do Ministério do Meio Ambiente (mais sobre isso adiante), as más notícias na área se acumulam como troncos de madeira cortados ilegalmente em um porto no alto do rio Amazonas.
A Câmara dos Deputados, por exemplo, quase votou uma alteração no Estatuto do Índio que não contava com o apoio dos indígenas. O texto mudaria o marco temporal para demarcação de terras indígenas e, basicamente, jogava no lixo todo o trabalho de reconhecimento de terras feito pelas autoridades após o dia 5 de outubro de 1988. Após o protesto de 700 indígenas, a decisão foi adiada.
Enquanto isso, no Pantanal e na Amazônia Legal Brasileira os indicadores de incêndio e desmatamento seguem muito melhores do que os do futuro, mas certamente bem piores do que os do passado. Segundo o Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (Lasa), as queimadas no Pantanal destruíram, a cada hora, o equivalente a 444 campos de futebol. Já o Instituto Socioambiental (ISA) descobriu que a taxa de desmatamento da Amazônia Legal Brasileira foi, em 2020, a maior em 12 anos.
Vale destacar, também, que o volume de apreensão de madeira ilegal pela PF só de janeiro a maio deste ano já é maior do que a quantidade interceptada desde 2018. Os dados foram obtidos pelo Achados e Pedidos, em parceria com a Fiquem Sabendo e a Abraji. Nada disso teria acontecido sem a ação humana.
Sai o vaqueiro, mas continua a passagem da boiada
Ricardo Salles não é mais um membro do governo Bolsonaro. Após garantir a queda de outro delegado da Polícia Federal que atuou na operação Akuanduba e receber elogios públicos do presidente, o agora ex-ministro do Meio Ambiente pode focar em outros projetos. O blog apoia a articulação para o afastamento de um deputado federal do partido Novo apenas pelo poder de entretenimento que o uso da sua suplência poderia causar.
O agora ex-ministro deixa para trás um rastro de desmatamento,queimada de florestas e frases dignas de quem só se importa com a opinião de madeireiro envolvido em atividade ilegal. Salles poderá aproveitar bastante o outono, o inverno, a primavera e o verão em solo brasileiro. Ao contrário de Abraham Weintraub, ele não poderá sair do país tão cedo.
Ricardo Salles continua a ser investigado pela operação Akuanduba. Os seus inquéritos podem sair do STF, o que o ajudaria a comprar tempo antes de ser julgado pelas suspeitas reveladas pelo Intercept em março do ano passado. E a situação não é lá muito favorável: mesmo tentando esconder o que está em seu telefone, a PF já levantou dados bem pesados sobre o ex-ministro e o blog não vê a hora em que assistiremos aos próximos episódios dessa saga.
Me engana que eu gosto
No lugar de Ricardo Salles entrou Joaquim Pereira Leite, até então secretário da Amazônia e Serviços Ambientais. O novo ministro é uma cópia do ministro anterior. Mesmo assim, fundos estrangeiros avisaram que estão com a esperança de que mudanças na área ocorrerão.
Esqueçam o que eu escrevi
Enquanto tudo isso acontecia, Osmar Terra foi à CPI da Covid dar o seu relato sobre a atuação do governo e as suas teses furadas. O aliado do governo foi confrontado sobre as teses de imunidade de rebanho e admitiu que aconselhou o presidente. Entre uma mentira e outra, insistiu no discurso negacionista e negou o que disse no verão passado.
Aula de epidemiologia e tapa de luva em arrombado
A CPI da Covid também escutou, no meio do escândalo da Covaxin (leia sobre isso a seguir), o epidemiologista e pesquisador da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Pedro Hallal. Ao lado da diretora-executiva da Anistia Internacional Brasil, Jurema Werneck, os senadores aprenderam como se combate uma pandemia e a porcentagem de mortes que poderiam ser evitadas se o governo não agisse como quem quer fazer um genocídio (80% das mais de 500 mil já registradas). Alguns senadores, em especial, aprenderam, também, como é receber um tapa de luva científico em cadeia nacional, mas isso é detalhe.
Minha mutreta, minha vida
A CPI da Covid e o Ministério Público Federal começaram a investigar a compra da vacina Covaxin. Produzida na Índia, a sua compra está cercada de indícios de crime. A falta de correções no contrato, o alto preço das vacinas e o fato de sócios da Precisa estarem envolvidos em outras investigações na Saúde são alguns deles.
A investigação, até então, estava restrita à esfera cível. A importação seria realizada por meio da Precisa Medicamentos e contou com o apoio do líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR). A negociação para a compra do imunizante foi a mais cara e mais rápida feita por um governo federal que não queria comprar vacina cara.
Tudo normal por aqui
A Precisa Medicamentos, por sinal, é um fenômeno. Durante o governo Bolsonaro, seus contratos com a União cresceram 6.000%. O seu dono, Francisco Maximiano, é dono de outra empresa (que vendeu e não entregou medicamentos ao governo) e contou com a ajuda do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) para receber apoio financeiro do BNDES. Logo após a ação, Flávio B. comprou uma mansão de maneira bem suspeita.
Agora é tarde
Como resposta às acusações de corrupção, o governo federal cancelou a compra da Covaxin a pedido da CGU enquanto essa edição era finalizada. R$ 1,6 bilhão já tinha sido empenhado para a compra dos imunizantes. Apesar de ser uma boa notícia, ela não livra ninguém que eventualmente tenha cometido delitos de ser preso.
Segundo os irmãos Miranda, Bolsonaro ouviu as acusações e disse que encaminharia o caso à Polícia Federal. Segundo a PF, nenhum pedido nesse sentido foi realizado. Toda a história foi levada a público com o apoio do presidente da Câmara, o deputado federal Arthur Lira (DEM-DF).
Pequenas notas do Quinto dos Infernos
A Privatização da Eletrobras servirá para algo: ajudar o governo a resolver pedalada no reajuste da energia em 2022.
Até a Abin tem suspeitas sobre a lisura da fortuna de Luciano Hang.
Não chame Bolsonaro de genocida pois ele fica puto se for acusado de ser um genocida.
Segue sendo muito ruim ser Sergio Moro.
O governo quer reformular o Bolsa Família. O @carapana tem uma sugestão de nome.
O caminho para a terceira via segue curto e tem passarinho sendo culpado por avisarem isso.
A Fundação Palmares não poderá brincar de Fahrenheit 451.
Filipe Martins virou réu por ter feito gesto racista no Senado.
O governo do presidente que quer a população armada para se defender da tirania estatal não quis apoiar a posse de spray de pimenta por considerar uma ameaça à existência do Estado.
Tem gado sendo alimentado com veneno e isso não é uma piada com apoiadores do governo tomando remédio contra piolho para matar vírus.
Quem tem, tem medo
Falando em quem pode ter (ou não) cometido delitos, o sócio-administrador da Precisa, Francisco Emerson Maximiano, recorreu ao Supremo Tribunal Federal contra a quebra de seus sigilos. A abertura dos dados foi determinada pela CPI da Pandemia. Maximiano, por sinal, deveria prestar depoimento à comissão, mas a sua fala foi remarcada após ele alegar estar em quarentena após uma viagem à Índia.
Abrindo a boca informalmente
O deputado federal Luis Miranda disse à imprensa que o presidente Jair Bolsonaro foi alertado sobre as possíveis irregularidades na compra da Covaxin. Além disso, segundo Miranda, o general Eduardo Pazuello perdeu o posto de ministro da Saúde por não ceder à essa tentativa de corrupção de agentes públicos. O alerta a Bolsonaro teria sido realizado pessoalmente pelo irmão do deputado, Luis Ricardo Fernandes Miranda, que é servidor do Ministério da Saúde.
Curso de mafioso 101
Onyx Lorenzoni não gostou de saber que essa história foi a público. Para demonstrar isso, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência nos deu uma aula sobre como a máfia lida com quem fala mal dela. Com muita agressividade e citação cristã, avisou que o deputado e seu irmão seriam investigados por avisar ao povo que o governo deveria investigar operações suspeitas.
O ministro negou que o governo tenha feito algum pagamento à Precisa. O dinheiro só foi reservado para o pagamento do contrato — que foi anunciado em fevereiro.
Onyx também afirmou que o recibo de importação apresentado pelos irmãos era falso. Faltou combinar com o Ministério da Saúde: o documento está disponível para consulta no sistema da pasta e a própria empresa responsável pelo envio admitiu a sua veracidade.
Pode vir quente que eu não estou tremendo
Miranda reagiu afirmando que pediria à CPI da Covid-19 a prisão do ministro por coação de testemunha. O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), conhecendo quem realizou as ameaças de colocar os Miranda para conversar com Deus, pediu segurança para ambos e seus familiares. Já o senador Renan Calheiros (MDB-AL), ameaçou atender aos pedidos de Miranda.
Abrindo a boca formalmente
Em depoimento à CPI da Covid, os irmãos Miranda deram mais detalhes sobre o caso. A informação mais importante, porém, foi deixada para o final do dia: segundo o deputado, assim que o presidente Jair Bolsonaro soube do esquema, apontou o líder do governo na Câmara como o responsável pelo "rolo" (Ricardo Barros nega as acusações).
Os irmãos também insinuam terem gravado a conversa com Jair Bolsonaro. Se verdade, a gravação pode causar um impacto maior do que o bloqueio de Luis Roberto ao sistema do Ministério da Saúde.
Pega, pega, pega
Após tudo isso acontecer, os senadores Randolfe Rodrigues, Fabiano Contarato (Rede-ES) e Jorge Kajuru (Podemos-GO) apresentaram uma notícia-crime no Supremo contra Jair Bolsonaro. Os senadores querem que o presidente seja investigado pela suspeita do crime de prevaricação nas negociações da compra da Covaxin.
O caso ficou com a ministra Rosa Weber. A ministra, na última semana, já avisou que há "grave suspeita" de indícios de favorecimento e obtenção de vantagens indevidas no processo de compra da Covaxin. Resta saber, agora, se Bolsonaro adotará uma estratégia tão eficiente quanto a de Michel Temer.
Balança, mas cai?
O partido do deputado Luís Miranda, o PP, reagiu a tudo isso discutindo a possibilidade de realizar uma representação contra o deputado no conselho de ética da Câmara. Mas sabendo que ele pode ter uma gravação de Bolsonaro, viram que o lugar certo para enviar o boleto era o Palácio do Planalto, não a casa de Miranda.
Enquanto isso, a CPI quer fechar o cerco ao líder do governo. A ideia é ampliar as investigações para apurar possíveis irregularidades na compra de testes contra Covid-19. Além disso, o líder do governo seria convocado a depor nos próximos dias.
Bolsonaro pode até tentar entregar a cabeça do líder de seu governo para a CPI. A medida deixaria os senadores alegres e diminuiria a pressão sobre o Planalto. Mas Barros já foi Ministro da Saúde no governo Temer, relator do orçamento de 2015 do governo Dilma, vice-líder do governo Lula e líder do governo na Câmara nos tempos de FHC, o que nos faz imaginar que o nome mais forte dessa briga é Barros, não Bolsonaro.
Em notas relacionadas
A compra da Covaxin não é a única que entrou no radar da CPI da Covid. A comissão também investigará a negociação feita pelo Ministério da Saúde para a compra de 60 milhões de doses da vacina Convidecia. A compra custaria R$ 5 bilhões e foi intermediada por uma empresa investigada pela Polícia Federal e que teve a participação dos empresários Carlos Wizard e Luciano Hang.
A Belcher Farmacêutica do Brasil é suspeita de fraudar a venda de testes de covid-19 para o Distrito Federal. Um dos sócios é filho de Francisco Feio Ribeiro, que é ligado a Ricardo Barros. O negócio foi cancelado após o laboratório CanSino, responsável pelo imunizante, descredenciar a farmacêutica brasileira.
Já a ex-mulher de Eduardo Pazuello resolveu abrir a boca na CPI da Covid — se a comissão tiver interesse. Andréa Barbosa enviou um e-mail elencando os pontos que poderia abordar sobre a atuação do ex-marido na pasta. A sinopse é digna do que se espera de um general brasileiro.
Bolsonaro mandou avisar que não tinha como saber tudo o que acontece nos seus ministérios — o que não livra ele de ser acusado de ter cometido crimes. O centrão quer esperar a gravação da conversa antes de fazer algo. Já Kassab mandou a letra: a situação está ruim e deve piorar.
A lição que fica é a seguinte: se presidente de nação latina subdesenvolvida, evite associar-se a alguém que tem USA e emoji da bandeira dos Estados Unidos no nome.