A Nova Era – Semana #146-147: terrorismo macroeconômico
A penúltima semana foi uma semana lenta, então a redação optou por uma edição dupla com todos os absurdos que o governo trouxe para nós.
Na CPI da Covid, temos o relatório final da comissão e o acomodamento de interesses difusos. No Ministério da Economia, temos reclamações de furo do teto quando a furadeira é utilizada para ajudar os mais pobres. E no Planalto? Nada que não seja tão absurdo quanto os absurdos das últimas edições.
Veja em detalhes o que aconteceu nas semanas #146 e #147 do governo Bolsonaro.
The following takes place between oct-12 and oct-125
Vaza a jato
A leitura do relatório final da CPI da Covid foi realizada na terça-feira (19). Mas o trailer do que Renan Calheiros (MDB-AL) falaria na CPI da Covid já estava disponível no dia 15: a máquina de vazamentos para a mídia adiantou que o presidente Jair Bolsonaro e os responsáveis por três ministérios de seu governo (Saúde, Trabalho e Defesa) teriam o indiciamento recomendado.
O rascunho do relatório feito por Renan Calheiros também atingia os filhos do presidente e o líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-AL). E como Renan adora uma boa confusão, o documento também indicaria o envio de denúncia de crime contra a humanidade ao Tribunal Penal Internacional.
O balão de ensaio de Renan Calheiros gerou reações de insatisfação entre os senadores, especialmente aqueles que fazem parte do grupo majoritário do colegiado. Omar Aziz (PSD-AM) postergou a leitura do documento para a quarta-feira (20) e sentou-se ao lado de Renan para encontrar um texto que fosse aprovado com mais facilidade: “pode acusar de crime contra a humanidade, mas genocídio indígena já é demais” teriam dito por aí.
Clima de já ganhou
O ministro da Saúde já trata casos como o da Prevent Sênior como “página virada”. Não é sem motivo: por maior que seja a vontade dos senadores de punir o presidente, eles ainda dependem da boa vontade do Procurador-geral da República, Augusto Aras, e de um relatório que seja capaz de ser aprovado com evidências e sugestões de indiciamentos nos tipos penais adequados.
Fica para outro dia
Quem deve se dar bem após a CPI da Covid é o general e ex-ministro Braga Netto. Ele foi um dos principais coordenadores da administração federal ao longo do processo de combate à pandemia, mas sem ser chamado a depor durante todos os trabalhos da comissão, não deve ter que acionar o jurídico para responder pelas suas péssimas posturas no último ano.
Morde e assopra
Renan Calheiros disse que o seu relatório foi modificado pelo menos dez vezes para conseguir agradar quase todo mundo. Não foi o bastante, já que até os não governistas criticaram partes do documento. Mas, batendo em quem dava para bater, o texto real oficial foi apresentado ao senado.
O relatório final de Renan Calheiros propôs o indiciamento de mais de 70 pessoas, entre médicos, políticos, jornalistas, influenciadores e empresários, por 24 crimes. A leitura do documento ocorreu um dia após depoimentos de parentes de vítimas da covid-19. Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) acusou os depoimentos de algo “macabro, triste e lamentável”, adjetivos que seriam totalmente adequados se estivéssemos falando do suposto envolvimento de um senador da República com milícias paramilitares.
Pequenas notas do Quinto dos Infernos I
O Brasil está prestes a ser o país dos PJtinhas, das pessoas que passam um dia ou mais sem o que comer, dos cidadãos que perdem (e perderão) renda nos últimos (e próximos) anos e da classe média endividada.
A sorte de Bolsonaro é que o Brasil é um país de evangélicos e não de católicos.
O governo adora a separação dos três poderes quando ela lhe é benéfica. Se não for, depende.
A Câmara dos Deputados quer resolver o problema do preço dos combustíveis jogando ele para 2023.
Guedes sempre falou muito mal dos subsídios concedidos pelo Estado brasileiro, mas esqueceu que poderia fazer algo ao chegar no poder.
O Brasil está no caminho errado para atingir as metas do Acordo de Paris.
Caminhamos firmes para uma eleição que não tenha gente unida para tirar o Bolsonaro do poder à esquerda e à direita.
Bolsonaro é o presidente com a maior vibe de taxista da nossa história.
Crianças Yanomami foram “sugadas e cuspidas” por draga de garimpeiros ilegais.
O Código Florestal foi flexibilizado.
A semana da pandemia I
Vamos começar com uma notícia boa: a taxa de transmissão de covid-19 no Brasil atingiu, na última semana, o seu menor patamar desde abril de 2020. O índice (0,60) indica que cada 100 pessoas infectadas transmitem o vírus para outras 60. Em outras palavras: a vacinação está reduzindo o número de mortes e o número de doentes.
Falando em vacinação, o Brasil já conseguiu imunizar completamente 100 milhões de pessoas. O número representa 47,11% da população, mas poderia ser maior: 16 milhões de pessoas estão com a segunda dose em atraso e o governo não gastou R$ 2,3 bilhões destinados à compra de vacinas contra a doença.
Tudo isso para dizer que os governos já estão preparando a volta das aulas presenciais em ritmo total. Em São Paulo, por exemplo, só ficará em casa quem conseguir um atestado médico. Também em São Paulo, segundo a Secretaria de Educação, a vasta maioria das escolas públicas não contam com infraestrutura mínima para receber alunos em segurança. Acontece.
A Fiocruz anunciou que já está negociando a produção, em terras nacionais, do molnupiravir. O medicamento é um antiviral que tem se apresentado eficiente no combate à covid-19. Se tudo der certo, não teremos a mesma dificuldade que tivemos com as vacinas para acessar o medicamento.
Auxiliando…
O governo quer destruir o Bolsa Família e, no lugar, colocar um programa que é eleitoreiro, ineficiente e sem fonte de recursos adequada. Teve até ministro da Economia que passou os últimos anos escorando-se em regra fiscal insustentável pedindo para darem uma pausa no teto de gastos.
A primeira tentativa de anunciar o programa foi suspensa pois, após meses de debate, não havia uma definição adequada para o valor do auxílio. Guedes e a sua equipe queriam R$ 300 reais — dentro do teto de gastos — e Bolsonaro queria R$ 400,00 — fora do teto de gastos, mas com ele dentro do Planalto em 2023. O mercado não gostou, mas gostaria menos ainda se soubesse o que seria o projeto final.
… gastando…
A equipe econômica trabalhou como pode, “lutou pelo melhor”, mas quem venceu, como sempre, foi a política. O Auxílio Brasil foi anunciado com um “pedala Robinho” no teto de gastos de R$ 30 bilhões de reais. O PT dobrou a aposta e pediu auxílio de R$ 600,00. A terceira via e os funcionários do Guedes? Disseram que cuidar do teto é mais importante do que cuidar da alimentação do pobre.
Dava para melhorar o Bolsa Família sem destruir ele no meio do caminho junto com o teto de gastos? Dava. Mas quando o governo tenta agradar o centrão com orçamento secreto e libera subsídio para caminhoneiro comprar diesel fica meio complicado. Aí não adianta reclamar quando a base na Câmara aumentar o benefício a pedido da oposição.
… e furando
O “waiver” do governo Bolsonaro para financiar o Auxílio Brasil será feito da maneira mais “governo Bolsonaro” possível. A PEC dos Precatórios será modificada para alterar o cálculo do teto de gastos (que seria revisto apenas em 2026). Com a contabilidade criativa, o governo ganhará todo o dinheiro necessário para ajudar os mais pobres.
Que o teto de gastos era insustentável todo mundo já sabia. O que não se previa é que ele seria jogado fora de um modo tão ridículo. Mas até então tudo não se tratou de uma quinta-feira fraca para o governo.
Pequenas notas do Quinto dos Infernos II
Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) viajou oficialmente para Dubai com a esposa e os filhos e depois disse que não usou dinheiro público no processo.
Os veleiros da Marinha Brasileira estão em uma situação pior do que a do teto de gastos.
Segue em alta: a gasolina, o diesel e o gás de cozinha.
O debate dos tucanos para decidir quem será o seu candidato em 2022 está cheio de dedo no cu e gritaria.
Caiu a PEC que alterava a composição do Conselho Nacional do Ministério Público.
O agrado do Bolsonaro para os caminhoneiros não funcionou como o esperado, mas as ligações entre o presidente do Banco Central e o banqueiro André Esteves, sim.
Allan do Santos, o Terça Livre, está com a prisão decretada.
O Facebook, o Instagram e o YouTube derrubaram mais uma live em que Bolsonaro falou mentiras sobre a covid-19 e a vacinação contra a doença.
Novos membros da Frente Ampla Liberal Isentona Unificada: militares.
O Ministério da Educação quer “construir” universidades federais nos redutos do centrão e não criar vagas durante o processo, que custará mais de R$ 500 milhões por ano.
A semana da pandemia II
Boa notícia para quem tem pets. Um estudo da PUC do Paraná indicou que somente 11% dos cães e gatos que vivem com infectados por covid-19 também ficaram doentes. O número daqueles que desenvolveu a doença ou fez a sua transmissão para humanos é menor ainda.
Enquanto isso, no sul do Brasil, a Câmara de Porto Alegre (RS) discutiu o veto do prefeito Sebastião Melo (MDB), o moderado, à exigência de passaporte vacinal. A sessão, porém, foi interrompida após manifestantes com cartazes com símbolos nazistas agredirem vereadores de esquerda. Aparentemente se indignar com gente fazendo apologia ao nazismo é coisa de esquerdista.
Bolsonaro paz e amor
Auxiliares e aliados querem que o presidente continue falando pouca bosta. Segundo a Folha, o “tom moderado” do presidente é incentivado para seduzir, outra vez, o eleitorado antipetista mais moderado. A gente sabe que o liberal médio brasileiro é muito corno, mas ser corno ao ponto de cair na lábia do presidente duas vezes nos parece um novo nível de cornitude.
Fez que foi, não foi e acabou não fondo
A definição do que seria o Auxílio Brasil não foi um processo simples. Muitos julgaram que Guedes sairia do cargo caso o presidente realmente insistisse em um modelo que levasse ao fim do teto de gastos. Como sabemos, eles estavam errados, mas o Planalto não deixou de buscar possíveis substitutos para o ministro.
Guedes deveria perceber, diante dos acontecimentos das últimas semanas, que ele é totalmente dispensável para o presidente. Aliás, ele já deveria ter notado isso quando Sergio Moro saiu de Brasília e foi trabalhar na iniciativa privada. Mas talvez o poder tenha cegado o ministro.
O movimento é sensual
Independentemente de quem terminar 2022 como ministro da Economia, há uma bomba relógio armada para o ocupante do Palácio do Planalto no ano de 2023. O financiamento do Auxílio Brasil será acompanhado do aumento da inflação, do custo da dívida pública e de uma conta política amarga: não manter o valor de R$ 400,00 após 2023 terá um custo político tão alto quanto o corte de privilégios necessário para impedir o programa de virar nota de rodapé nos livros de História.