Lulaverso – Semana #02: déjà coup
A invasão dos prédios dos três Poderes, a leniência das forças de segurança pública e a minuta do golpe.
Tudo isso e muito mais no resumo da semana #02 do governo Lula.
The following takes place between jan-08 and jan-14
Os lenientes I
O golpismo criminoso que invadiu o Congresso não agiu sem o apoio de muita gente poderosa — ou a sua deliberada leniência. Na véspera dos ataques do dia 08, a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) avisou a 48 órgãos do Governo Federal que a capital nacional encontrava-se em risco. A única atitude tomada foi a convocação, por parte do Ministério da Justiça, de 150 policiais da Força Nacional para a proteção da Esplanada dos Ministérios (algo que o próprio ministro Flávio Dino reconheceu que não foi suficiente).
Os lenientes II
O Comando Militar do Planalto, responsável pela segurança do palácio do presidente, não foi mobilizado. Já o Exército auxiliou os golpistas a saírem do Palácio do Planalto sem encontrar a PM e impediu que a Polícia Militar desmobilizasse o acampamento na frente do seu Quartel General. Com os manifestantes contando com a proteção desavergonhada do General Júlio César de Arruda, ficaria complicado mesmo.
Os lenientes III
Já o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), responsável pela segurança do Palácio do Planalto, desmobilizou o esquema de segurança do prédio cerca de 20 horas antes dos atos golpistas de domingo. A decisão deixou a unidade do Batalhão da Guarda Presidencial praticamente sem equipamento de controle de tumultos e só foi revertida por iniciativa do Comando Militar do Planalto. O GSI foi aparelhado comandado, nos últimos 4 anos, pelo general Augusto Heleno.
Ajuntar…
Uma vez que as forças de segurança optaram por fazer algo, mais de 1.500 pessoas foram detidas para averiguação. Há a expectativa de que a Polícia Federal indicie cerca de 1.000 pessoas, que também serão encaminhadas para o Complexo Penitenciário da Papuda, no Distrito Federal. Mas não sem antes passarem por um acampamento coletivo “terrível” e “desumano” (foram obrigados a tomar vacina) com condições muito melhores do que a de qualquer congresso estudantil da UNE.
… e punir
Alexandre de Moraes determinou a prisão de Anderson Torres, ex-ministro de Bolsonaro e responsável por garantir a segurança de Brasília (DF) no dia 8 de janeiro de 2023. A ordem também incluiu Fabio Augusto Vieira, ex-comandante da Polícia Militar do DF. Ambos são acusados de serem “omissos e coniventes” com os ataques ao Congresso, Planalto e Supremo.
Onde estava Torres no dia 08? Nos Estados Unidos, na mesma cidade onde Bolsonaro se refugiou após ser derrotado nas eleições de 2022. Além disso, Moraes determinou que a PF realizasse buscas no endereço do ex-secretário no Brasil, algo que se mostrou muito produtivo. Torres se entregou assim que retornou ao Brasil, utilizando um sobrenome menos tradicional para escapar da imprensa.
A minuta do golpe
Ao realizar uma operação de busca e apreensão na casa de Anderson Torres, a PF encontrou uma minuta (proposta) de decreto para o presidente derrotado nas eleições de 2022, Jair Bolsonaro, instaurar estado de defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral. A medida daria respaldo jurídico para que Bolsonaro revertesse a vitória de Lula (PT) nas eleições de 2022. Em outras palavras, era um AI-1 para Bolsonaro.
Torres até negou — falsamente — que se encontrou com Bolsonaro no dia sete, mas preferiu não mentir sobre a minuta golpista encontrada em seu apartamento. Em seu Twitter, o ex-ministro da Justiça admitiu que o documento era verdadeiro e que prevaricou diante da apresentação de um plano golpista. Sobre o desmonte da Secretaria de Segurança Pública do DF, Torres se calou.
Pequenas notas do Quinto dos Infernos
Todo dia um otário e um esperto saem de casa, mas às vezes o otário sai de dentro de uma barraca.
A identificação dos baderneiros do domingo (08) tem sido feita com o apoio de pessoas anônimas e rastros em redes sociais.
O Brasil conta com um Ministério dos Povos Originários comandado por uma indígena.
A intervenção federal na segurança do Distrito Federal foi aprovada com críticas de bolsonaristas pragmáticos (parlamentares do Novo) e voto contra de bolsonaristas ideológicos (Flávio Bolsonaro, Carlos Portinho, Luiz Carlos Heinze, Carlos Viana, Eduardo Girão, Plínio Valério, Styvenson Valentim e Zequinha Marinho).
O Procurador-Geral da República, Augusto Aras, resolveu ser democrata e criou um órgão de defesa da democracia.
A postura conciliadora de José Múcio (Defesa) está incomodando vários petistas, menos Lula.
Há a suspeita de que a Abin ainda trabalhe para Bolsonaro.
A galera do e-sports quer ser qualquer coisa, desde que dê dinheiro.
O Partido Liberal tenta aprovar na Câmara um projeto que concede anistia a todos que tenham se envolvido a favor dos bloqueios em rodovias após o segundo turno das eleições.
Fernando Haddad (Fazenda) lançou um ousado programa para melhorar as contas públicas. Agora é necessário combinar com os russos.
Follow the money
O ministro da Justiça pretende responsabilizar os financiados da micareta golpista. Segundo Flávio Dino, já há a convicção de financiamento empresarial e agora basta apenas achar as provas do levantamento de recursos. Financiadores em ao menos dez estados já foram identificados.
Simbolismos
“Eles querem golpe, mas golpe não vai ter.” Essa foi a frase utilizada pelo presidente Lula na frente de 27 governadores, ministros do STF e parlamentares para indicar que as principais lideranças políticas do Brasil não pretendem abrir espaço para ameaças golpistas. Depois disso, o petista chamou os participantes para irem a pé até o Supremo Tribunal Federal para examinar a destruição deixada pelos bolsonaristas — um gesto que somente uns cinco políticos brasileiros vivos conseguiriam pensar.
Money, money, money, money: money
Jair Bolsonaro gastou R$ 27,6 milhões com cartão corporativo em 4 anos. Os gastos foram publicados em resposta a pedido da Fiquem Sabendo e também envolvem outros presidente. As planilhas mostram faturas de quase R$ 5 milhões em feriadões, compra de produtos em locais em que o presidente não se encontrava e uns cafezinhos mais caros que carne com folha de ouro.
Passarinho que está na gaiola canta mais alto
A defesa do governador afastado Ibaneis Rocha (MDB) afirmou ao STF que o plano de ações de segurança pública organizado para conter os manifestantes no domingo (08) foi sabotado pelos seus executores. Ainda de acordo com a defesa, havia um “protocolo de ações integradas, previamente elaborado” e que foi “inusualmente descumprido, permitindo ou facilitando os inacreditáveis e irremissíveis atos de violências”.
A fala foi reforçada após o depoimento do ex-comandante da PM do DF, Fabio Augusto Vieira. Em fala à Polícia Federal, na última quinta-feira (12), Vieira afirmou que o Exército impediu que houvesse prisões no acampamento em frente ao QG das forças armadas na noite do domingo (08).
Imagina o que saberíamos se uma delação premiada fosse fornecida a Ibaneis e Vieira.
Passarinho que está na gaiola cantará mais alto?
Aliados próximos de Bolsonaro temem que Anderson Torres iniciará o processo de delações premiadas cometidas por antigos aliados do ex-presidente. Já no PL, há a quase certeza de que a minuta do golpe será utilizada para abrir uma investigação contra Bolsonaro e torná-lo inelegível. Se somente isso acontecer, sairá barato, afinal, Bolsonaro passou a ser investigado no inquérito que apura a instigação e autoria intelectual dos ataques golpistas do dia 08.
Sindicalismo golpista
Tudo isso posto, a última semana mostrou que as Forças Armadas — ou ao menos uma parte relevante e poderosa delas — deixou de se articular apenas por aumento de salário. E há mais movimentações além de militares e parentes apoiando, operacionalmente e politicamente, as movimentações golpistas que atingiram Brasília no último dia 08. Membros das Forças Armadas também querem a anistia a uma boa parte dos envolvidos com o apoio de gente na sociedade civil.
Se a intenção dos militares é evitar o “precedente Pazuello”, o Exército não deveria iniciar uma campanha para fazer o país esquecer das suas ações pelos manifestantes golpistas. Além disso, militares da ativa não pressionariam contra pedidos de prisão e/ou investigação contra os seus pares ou intimidariam o poder civil. Pior ainda: não teriam dado motivos para a inteligência dos EUA avisar o governo brasileiro de uma tentativa de golpe.
De toda forma, perde a sociedade, que agora tem uma boa quantidade de declarações dos "militares anônimos” mostrando que Lula tem menos controle das Forças Armadas do que deveria. Eduardo Cunha estava certo ao desejar que Deus tivesse misericórdia da nossa nação.